Anonymous (Chapter 1) - Fri 15 Jul 2016

Prólogo 1812 - Dover, Inglaterra As nuvens que assinalam as tempestades de inverno invadiam o céu da meianoite, cobrindo a lua e as estrelas. Apenas o murmúrio distante das ondas quebrando na areia guiavam a figura envolvida em um manto, em direção ao mar, onde um navio ancorado esperava sua carga preciosa: um medalhão. Lágrimas sulcavam as faces enregeladas da mulher. Estava tão perto de sua salvação, mas sabia que não teria tempo. Seguia a pé; seu cavalo quebrara a perna e precisara ser sacrificado, e com o som distante dos cascos a galope se acercando depressa, sabia que em breve seus inimigos a atacariam. Segurou com força o pequeno adorno na palma da mão gelada. Parecia um objeto tão insignificante... Entretanto, o segredo oculto entre as duas partes douradas era o suficiente para fazer uma nação inteira se prostrar de joelhos. Ansiosa, pensou que se acaso tivesse conseguido pelo menos tirar o medalhão do país, seus inimigos não teriam conforto e paz de espírito. A mulher pareceu tomar uma decisão, afrouxou os dedos que prendiam a carga preciosa, e fez o medalhão voar em meio ao vento, e cair adiante. Minutos depois, o som abafado de um tiro pôs um fim sangrento à perseguição. Mas o medalhão permaneceu perdido, enterrado sob a areia da praia. Um mês mais tarde, quando os últimos resquícios do inverno desapareceram, o medalhão brilhou ao sol. Seu fulgor chamou a atenção de uma jovem cigana que passava. Recolhendo o pequeno objeto, limpou a sujeira que o envolvia, e o colocou no pescoço. Capítulo I 1817 — Sussex A criadinha se apressou pelo corredor, uma trouxa de roupas de linho bem segura nos braços. Era uma das doze trouxas que precisavam ser lavadas nos próximos dois dias, e como a moça era nova na mansão, estava ansiosa para agradar sua senhora, cumprindo a tarefa sem atraso. Ignorava que um par de olhos verdes e sensuais perscrutava o corredor em busca de diversão. Esses olhos pousaram sobre o rosto fresco e angelical da criada e brilharam ao percorrer as formas arredondadas de seu corpo firme. Lorde Anthony Kennington, terceiro visconde Hastings, não resistiu ao desejo de piscar um olho de modo sugestivo, e enviar um sorriso encantador para a jovem criatura. E a criada também não resistiu à tentação e afundou as faces coradas em sua trouxa de roupa. Era Meg, não? Ou talvez Mary? Não lembrava seu nome, mas a jovem lhe proporcionarAmbos se cruzaram em silêncio no corredor, e só quando a moça já estava distante, Anthony se permitiu soltar uma risada. a uma boa diversão na noite anterior, quando a encontrara, sozinha, espanando os móveis da biblioteca. Já que seu pai passava a maior parte do dia trancado nesse cômodo, a criadagem só tinha a noite para realizar suas tarefas ali, e Anthony agradecia essa quebra na rotina doméstica. Sem dúvida que Mary-Meg era uma garota disponível para uma travessura, e após algumas palavras sussurradas em seu ouvido, os dois logo se viram abraçados e arfantes, em uma posição estranha, sobre a escrivaninha de mogno da biblioteca. Ah! Retornar ao campo! Precisava procurar Mary-Meg outra vez... duas vezes, se tivesse tempo. Uma jovem tão ansiosa e disposta ao sexo era difícil de encontrar entre as espessas paredes das mansões londrinas. As botas de Anthony produziam um rumor agradável, e as abas de seu paletó, que alcançavam os tornozelos, adejavam, quando abriu a porta da sala de visitas. Lady Ashley Winthrop baixou o trabalho de agulha sobre o colo, e lançou seus olhos também verdes sobre o. visconde. — Pode me dizer o que acha tão engraçado? As lembranças sobre a sensual Mary-Meg, pensou Anthony, percebendo que ainda sorria. Mas tratou de afastar os pensamentos traquinas para responder com prudência. — Bem, a visão de seu tricô, é claro. Ashley franziu os lábios, e o gesto austero fez Anthony sorrir ainda mais. Fechou a porta e se aproximou de sua irmã gêmea, beijando-a na face. Sentou-se na poltrona em frente para observar seus movimentos com as agulhas. — Tentando um novo passatempo, Ash? A irmã perdeu o ponto, ficando vermelha como um pimentão. A risada de Anthony ecoou pela sala. — Por que não deixa o tricô para as solteironas e dá um passeio pelos gramados? O ar fresco lhe fará bem. — Não seja ridículo! — Com a testa franzida, Ashley contou os pontos e retornou ao trabalho. — Já cheguei até aqui e pretendo terminar o par. — Par do quê? Com orgulho, a irmã ergueu parte de dois minúsculos sapatos de lã cor-derosa, não muito bem feitos. Dessa vez o sorriso de Anthony foi carinhoso para sua sobrinha, objeto dos esforços manuais da mãe. — São para Myra? Mas ainda estamos em meados de abril. — Pretendo dar o último ponto em novembro — prometeu Ashley com determinação. Anthony balançou a cabeça com ar divertido, e fincou os cotovelos nos braços da poltrona, cruzando os dedos. — E onde está minha sobrinha? — Nos jardins com o pai e a irmã mais velha. — Então creio que toda a família se refugiou em algum canto, de alguma maneira. — Exceto mamãe e Cecília, sempre vigilantes. Anthony não ficou surpreso. Recostou a cabeça na poltrona e fechou os olhos. — Bem, de fato, acabei de ver muita comoção na ala oeste. Os olhos de Ashley abandonaram o tricô e se cravaram no irmão. — Posso perguntar o que viu? — Apenas um caos completo. Ordens gritadas de um lado para o outro, que ninguém ouvia, todos parecendo muito ocupados, mas sem saber aonde ir ou o que fazer. Para começar, a grande sala de jantar mais parece uma colméia de abelhas loucas. — Assim como o salão de baile. Anthony fitou a irmã com os olhos semicerrados. — E o que há no salão de baile? — A mesma correria. Passei toda a manhã providenciando os arranjos, e por sorte a grande amiga de mamãe insistiu em assumir essa tarefa. — E então aqui está você. — Isso mesmo. — Ashley suspirou, recordando a trabalheira da qual se livrara. — Será um milagre se tudo isso der certo. Sinceramente, Anthony, não me lembro dos preparativos para o meu primeiro baile terem sido assim trabalhosos e exaustivos. Ashley debutara em sociedade sozinha, e Anthony só fora apresentado na Corte depois de completar seus estudos em Cambridge. Quanto à irmã caçula, Cecília, o programado baile de gala seria o seu primeiro, uma espécie de apresentação à elite antes do début oficial no palácio de St. James. — Seu baile de debutante também foi exaustivo, Ash. A questão é que você era uma garota com cabeça de vento, e um pouco de desordem lhe caía bem. Ashley voltou a cerrar as sobrancelhas. — Nós dois não somos assim tão velhos, Anthony. O irmão voltou a rir. — Levando em consideração que estamos escondidos em uma saleta para evitar os preparativos da festa, creio que a velhice já chegou. A gêmea franziu os lábios em um muxoxo de desprezo, e voltou a tricotar. — Essa celebração vai custar uma pequena fortuna para papai. — Acho que sim. Haverá até uma enorme gaiola com pombas. Ashley arregalou os olhos e começou a rir, pressionando os dedos sobre a boca. — Está brincando! — Não. — Pobre papai! E pobre de nós. Precisarei de um descanso quando essas festividades terminarem. — Deveria ter pensado nisso antes de se oferecer para acompanhar Cecília na temporada social, minha irmã. Ash ergueu as sobrancelhas douradas. —Não me ofereci! Fui convocada por nossa própria irmãzinha, e sabe como ela pode ser mandona. Pelo menos mamãe irá nos acompanhar a Londres, portanto não precisarei comparecer a todos os eventos com Cecília. — Parou de tricotar e olhou ao longe com tristeza. — Esperava poder ir a Paris na primavera. — Pois trate de prorrogar esse sonho para um futuro distante. —E você faça o mesmo, Anthony; esta temporada irá requisitar toda a nossa atenção, e se não estou equivocada, você também terá uma missão. — Sem dúvida — resmungou o visconde. Teria que analisar e pesquisar sobre os prováveis admiradores da irmã para que seu pai desse a resposta final. Anthony fora poupado dessa responsabilidade maçante quando Ashley debutara, mas dessa vez não haveria desculpas, e isso o exasperava. Seu pai; Reginald Kennington, conde de Wenhem, só teria o trabalho de escolher um entre os pretendentes selecionados, por isso estava tão contente e animado. Porém havia um outro motivo para essa sua satisfação, e Anthony estava muito consciente disso; desejara jogar mais responsabilidades sobre os ombros do filho, pois achava que Anthony não tinha muito com que se ocupar. Bem, isso era verdade, refletiu o visconde, porém não estava nada feliz, pois teria que abdicar de seus prazeres noturnos e diurnos, passeando com Cecília de dia e analisando seus admiradores de noite. Quando iria dormir? — Será um tormento — disse em voz alta. — Terei que fazer uma lista das qualificações necessárias para o futuro marido de Cecília, e me relacionar com todos os seus pretendentes. — Oh! Que martírio! — ironizou Ashley. — Pelo menos não terá que comparecer a dúzias de bailes da temporada. Por fim a irmã deixou de lado o tricô com um bocejo entediado, e se recostou na poltrona. — Quer uma xícara de chá? Anthony sorriu. — Adoraria, obrigado. Rumando para o carrinho de chá, Ashley entornou na xícara de porcelana o líquido cor de âmbar ainda fervente, e comentou. — Senti sua falta no café da manhã. — Não queria ser incomodado logo cedo com uma conversa sem fim sobre os preparativos do baile e a decoração do salão. Preferi ficar sozinho. Ash entregou-lhe a xícara. — Entendo. À procura de diversão, talvez? A sugestão da irmã, que o conhecia bem, fez Anthony sorrir com ar travesso. — Nada muito selvagem, garanto. Os bosques por aqui estão cheios de fadas e elfos, e as águas repletas de ninfas. Pensei em perambular pelas redondezas, a fim de encontrar uma criatura mística. O olhar penetrante da irmã não o deixava. — E posso perguntar se encontrou alguma ninfa ou fada? — Oh! Não! Uma pena, pois tais criaturas poderiam me lançar um encantamento e me carregar para longe desta loucura. — Por favor, trate de se lembrar que é o début de Cecília, e não pode terminar com escândalos, portanto trate de se afastar de "ninfas" e "fadas" ou qualquer coisa que use saias. Os gêmeos eram muito íntimos, e Anthony não teve pejo de perguntar. — E o que devo fazer por aqui senão perseguir um rabo-de-saia? — O problema é que vive entediado, meu irmão. — Ashley bateu com a ponta dos dedos no rosto, como se pensasse seriamente, e depois sorriu. — Tenho a solução perfeita! Casamento! Anthony sentiu os cabelos arrepiar na nuca, ante a sugestão da irmã. Era a meta de toda mulher colocar armadilhas para os homens, e obrigação de todo varão tentar escapar disso. Não via motivos para deixar de ser solteiro quando ainda era tão jovem. Por outro lado, sua gêmea considerava o casamento como a melhor solução para uma vida de vícios. — Ash — murmurou com paciência — sugerir casamento para um homem no verdor dos anos é terrível. Está mesmo disposta a acabar de vez com minhas diversões. — Ou, pelo menos, reduzi-las. Cá ente nós dois, sabemos que nenhum juramento o fará desistir das mulheres em geral. Anthony sorriu para a gêmea que o conhecia tão bem. — Tem razão. Deus fez o belo sexo atraente demais para que os homens possam resistir. Ash tornou a fazer um muxoxo de desdém. — Uma bela desculpa desde Adão! — Bem, se todo homem tem falhas, a paixão pelas mulheres não é o pior dos crimes. — Precisa ter mais responsabilidades, Anthony. — E uma esposa seria a solução ideal — dardejou o visconde, tentando pôr um ponto final na discussão. Houvera um tempo em que Ashley pouco se preocupara com suas aventuras, mas quando se casara com um cavalheiro fiel, digno e respeitável, passara a raciocinar que todos os homens podiam ser convertidos e se tornar maridos exemplares. — Por certo uma esposa o fará deixar as aventuras, e quando li ver filhos, precisará pensar menos em si mesmo. Tal descrição sobre o casamento o deixou apavorado. Não pensaria sobre isso nos próximos vinte anos! — Lamento desapontá-la, Ash, mas não tenho intenção de me casar logo. — Para ser sincera, não sei onde encontra forças para tantas aventuras! — Ora! Sou seu irmão gêmeo! Devia me apoiar. Onde está sua lealdade, irmãzinha? — Sou muito leal, acredite. Não imagina quantas histórias ouço a seu respeito, cada uma pior que a outra! Se mencionasse a terça parte delas para nosso pai, o pobrezinho teria uma apoplexia! Um olhar cético de Anthony a fez emendar. — Está bem. Mamãe teria. Papai já não se ilude a seu respeito. A porta da sala se abriu nesse instante, e Edith entrou com o pai c o bebê Myra. — Aqui estão vocês — saudou Daniel Winthrop com sua voz jovial. — Que horrível ficar dentro de casa em um dia como este! — Recuperando as forças — resmungou Anthony, recebendo um olhar irado de Ash. Edith se aproximou do visconde e estendeu um jacinto debaixo do nariz do tio. — Cheire! — ordenou a garotinha de quatro anos. O visconde obedeceu. — Tem um perfume divino. Sorrindo, Edith colocou a flor branca na lapela de Anthony. Daniel riu. — Também ganhei uma flor. Sem dúvida dá um toque refinado aos trajes. — Tem razão — resmungou Anthony. — Torna qualquer homem um cavalheiro. — Mas papai não me deixou brincar na terra. -— Coitadinha — consolou o tio, afagando os cabelos louros da sobrinha. Dessa vez a porta se abriu para que Cecília entrasse. — O que todos fazem aqui? — Recuperando as forças — retrucou Daniel, recebendo um olhar de censura da esposa. Anthony sufocou uma risada, e se levantou. — Boa tarde, Cecília. Desde que chegara à propriedade havia alguns dias, mal vira a irmã caçula, sempre às voltas com os preparativos para seu ingresso na sociedade, que aconteceria no seu aniversário de dezessete anos. Sete anos mais velho, Anthony nunca fora muito íntimo de Cecília, e pouco tinham a dizer um ao outro. Ashley também não conseguira estabelecer muita intimidade com a caçula, que era o orgulho e a alegria da mãe. De maneira inesperada, Cecília entrara na vida da família quando ninguém mais esperava que a condessa pudesse ter outro filho, e por isso se tornara a preferida da mãe. Ambas adoravam pompa e ostentação, e ser o centro das atenções; um grande baile seria a combinação perfeita de suas paixões na vida. Cecília beijou o irmão, e rumou para Ashley, os cachos louros dançando a cada passo. — O salão de baile está em ruínas! Disse isso sem delongas para lady Hawthom. — Quê?! — exclamou a irmã mais velha, atônita. — Mas lady Hawthorn me garantiu que dará um jeito nos últimos detalhes. Ashley suspirou aliviada, percebendo que fora só uma frase de efeito de Cecília, que adorava um pequeno drama. — Trate de ir diretamente ao salão de baile e desculpe-se com lady Hawthorn, senhorita. Diga que seus nervos estão à flor da pele, caso contrário ela pensará que é uma insolente. Nesse instante a mãe de Anthony entrou na sala, recriminando Cecília por ter sido rude com a amiga, Cecília replicou, e o caos foi formado. Sentindo que começava a ficar com dor de cabeça, o visconde tratou de se esgueirar para bem longe. Anthony meditava perto dos salgueiros. Uma mecha de cabelos louro-cinza caiu em seus olhos, e afastou-a com um gesto rápido. Começava a pensar que havia pouco espaço no mundo onde um homem podia ficar longe de mulheres palradoras e obcecadas por casamento. Mas estava determinado a escapar dessa armadilha a qualquer preço. O matrimônio era uma seqüência de responsabilidades e deveres sem fim, e um cavalheiro se sentia obrigado a elaborar um plano minucioso para poder manter uma amante sem que a esposa soubesse. A extravagância do baile de Cecília era uma prova do trabalho que as mulheres tinham para atirar seu laço sobre os pobres incautos. De repente, o que lhe pareceu um lenço multicolorido, flutuou um pouco à frente. Correu até a pequena ponte, mas antes que conseguisse agarrar o tecido colorido, viu que caía na água e era levado. Curioso, atravessou a ponte e o seguiu riacho abaixo, até que o lenço se deteve onde a água era muito rasa. Ali perto, sentada sobre uma enorme pedra, os pés descalços dentro da água, os dedos longos penteando a cabeleira negra, viu a ninfa legendária que andara procurando. Um sorriso maroto aflorou aos lábios do visconde. Ali estava o motivo concreto de não desejar desistir do belo sexo por causa de uma só mulher. Quem em seu juízo perfeito resistiria à tamanha beleza e graça? Encostou-se ao tronco de uma árvore, permanecendo um pouco distante, e cruzou os braços sobre o peito, analisando a criatura selvagem. Usava um vestido muito simples cor de marfim, com a barra erguida até os tornozelos, e preso entre as pernas, para que pudesse molhar os pés. Quadris arredondados subiam até uma cintura muito fina, e seios maravilhosos surgiam sob o corpete de renda. Apesar dos raios fortes do sol, a água fria do riacho provocara a reação natural em seu corpo, intumescendo os mamilos rijos, que surgiam nitidamente sob o tecido fino. Anthony não conseguiu evitar a imagem daqueles seios entre suas mãos, seus lábios procurando os mamilos túmidos. Fechou os olhos, ouvindo o murmúrio das águas do riacho e o cantar dos pássaros, até que o clamor sensual arrefecesse, e se sentisse mais calmo. Reabriu os olhos e o brilho de algo no pescoço da jovem chamou sua atenção; era um medalhão de ouro que combinava com as argolas douradas em suas orelhas. Inclinando-se para frente, a ninfa colocou as mãos em concha para molhar o rosto, revelando uma marca de nascença no ombro direito, com o formato de uma lua crescente. Anthony suspirou, imaginado que outros sinais ela teria no resto do corpo, enquanto a via sorver a água límpida e lamber os lábios com a ponta da língua, o que o excitou ainda mais. Parecia hipnotizado, pois não conseguia desviar o olhar da aparição, porém o encantamento ainda não terminara. Como se sentisse o olhar penetrante sobre seu corpo, a jovem olhou ao redor, até se deter no intruso que a mirava, semiescondido nos bosques. Foram os olhos da ninfa que causaram o encantamento final; eram azulcobalto, sombreados por cílios negros e espessos, e transmitiam uma infinidade de emoções, experiências, sonhos e segredos não revelados. No instante seguinte a jovem se ergueu, correu para a margem, e tentou se abrigar entre as árvores. Anthony voltou a suspirar, frustrado. Lamentava o fim de tão bela visão, mas manteria a lembrança vivida de sua ninfa gravada na mente. Teria a moça se sentido tão ultrajada ou amedrontada com sua presença para deixar quase todos os seus pertences para trás em uma sacola, e correr descalça pelos bosques? Não podia deixá-la partir assim, seminua e com frio. Em um gesto galante, resolveu persegui-la com a sacola debaixo do braço. A ninfa era rápida, mas as pernas do visconde eram mais longas, e logo a alcançou. — Deixe-me ir! — exclamou a garota, batendo com os punhos fechados em seu ombro e peito. — Não desejo lhe fazer mal — replicou Anthony, tentando aparar os golpes. — Só queria devolver seus pertences. Assim dizendo, tratou de passar a sacola para suas mãos, mas não recebeu nenhum agradecimento por isso. Erguendo a perna com uma agilidade de dançarina, a moça desfechou um chute no queixo de Anthony, e desapareceu na mata. Perplexo e zonzo pelo golpe, o visconde Hastings vacilou. Passando a mão pelo queixo dolorido, a prudência lhe disse que desistisse e fosse embora, mas rechaçou tal idéia, mesmo porque estava furioso e ferido em seu orgulho. Ia voltar a persegui-la, quando viu dois homens se aproximando, e que haviam surgido do ponto onde a ninfa desaparecera. — Conhece a moça? — inquiriu um deles sem preâmbulos. — É claro que não! — respondeu Anthony. Os dois pareceram não estar convencidos, porque se atiraram sobre o nobre. Rápido como um raio, o visconde segurou um deles pelo colarinho e o ergueu no ar, desfechando um soco que fez o homem cair mais adiante. Voltou-se para o segundo, mas viu que ele brandia uma faca sobre sua cabeça. — Fique longe de nossas vistas — rosnou o brutamontes. — Acho que não — murmurou Anthony, com gesto rápido retirando o punhal que sempre trazia à cintura quando se embrenhava nos bosques, e atingindo o outro no braço. O sangue esguichou e, irado, o homem contra-atacou com a faca, porém o visconde era experiente, e dominou o estranho, que rosnou. — Essa cigana imunda é uma criminosa! Não tem o direito de interferir com sua prisão! Uma cigana? Sim, é claro! Devia ter imaginado, refletiu Anthony. O lenço colorido, o estilo de suas roupas, os olhos exóticos, os longos cabelos negros. Não existiam leis que protegessem os ciganos, portanto não haveria repercussão, caso os homens a prendessem e fizessem com ela o que bem desejassem. Com a ponta do punhal erguida na altura do coração do outro, perguntou: — Do que essa mulher é acusada? — É uma ladra, e quero levá-la à justiça! O visconde resmungou com desdém. — Duvido... Sem dúvida era uma desculpa esfarrapada para que pudessem importunar a pobre menina, pensou. Não era a primeira vez que uma mulher cigana se via assediada por cafajestes. — Saia da minha frente! — voltou a ameaçar o homem. — O medalhão é meu! Ah! O medalhão! Então o berloque era o motivo da grande comoção, concluiu Anthony. Mas não passava de um enfeite comum sem grande valor. Por certo não merecia tanta atenção. Não. Aqueles brutamontes queriam outra coisa... O estranho tentou atacar, mas recebeu um corte na face. — Sugiro que os dois sumam daqui — vociferou o visconde. Na verdade não estava sugerindo, mas ordenando. Porém o homem não se dava por vencido. — Não descansarei até ficar com o medalhão! Farto do diálogo inútil, Anthony atingiu o rufião com um soco potente, que o fez se estatelar no solo, junto ao companheiro já desacordado. Limpando o suor da fronte, o visconde se voltou para o bosque, certo de que a cigana desaparecera, mas lá estava ela, caída no chão e imóvel. Ajoelhandose a seu lado percebeu uma ferida na lesta e outra na cabeça, e tocou-a com delicadeza. A jovem batera com a cabeça em uma grande pedra logo atrás, no perder o equilíbrio quando tentava recuar na mata. — Bem, ciganinha, estou disposto a ajudá-la, apesar do chute que me deu no queixo. Com cuidado, retirou o paletó e cobriu-a. Em seguida recolheu seus pertences espalhados, enfiando tudo na sacola que encontrara. Colocou o fardo nas costas, e tomou a ninfa desmaiada nos braços, rumando para a mansão. Sabrina Kallos flutuava em uma nuvem, ou essa era sua impressão. Maciez e um calor agradável a circundavam. Um raio de sol beijava sua pele fazendo-a sair de uma sonolência profunda. Mas assim que o despertar a arrancou dos sonhos, sentiu uma terrível dor de cabeça. Com uma careta, arregalou os olhos, e levou algum tempo para que sua visão nublada entrasse em foco. O sol do ocaso penetrava pelas altas janelas, lançando um brilho de fogo pelo ambiente estranho que a cercava. Girando a cabeça para o lado, a fim de evitar a luminosidade que feria seus olhos, espantou-se com o tamanho do quarto onde se encontrava. Era enorme! E tudo lã dentro era grande também. Teto alto, janelas monstruosas, uma cama gigantesca de colunas com um dossel escuro. O quarto era maior que a carroça onde morava com o pai! Móveis elegantes e entalhados enchiam os espaços, assim como candelabros de bronze. A um canto o fogo dançava na lareira, e estantes estavam recheadas de livros e ornamentos. Quadros nas paredes exibiam cenas de bosques e de caçadores e cães perseguindo uma infeliz raposa. Sabrina não gostou dessa imagem, pois se sentia como a raposa da pintura, e a idéia do perigo que talvez corresse a fez estremecer. Porém foi a silhueta do homem parado de costas junto a uma das janelas que chamou sua atenção. As lembranças começaram a voltar. Fora atacada nos bosques, mas o resto era escuridão. Onde estava? Quem era seu captor? Uma rápida mirada para os próprios pulsos a assegurou que não estava amarrada. Apenas os lençóis de linho cobriam seu corpo despido, mas não conseguia ver suas roupas em nenhum lugar. Com o coração batendo em sincronia com o latejar nas têmporas, tentou se sentar, mas uma terrível tontura a dominou, e tomou a deitar a cabeça nos travesseiros, com um gemido angustiado. A figura na janela se virou e correu para o lado da cama. — Afaste-se de mim! — sibilou a cigana. O homem se deteve a meio caminho. — Não precisa ficar assustada. — Onde estou? — A salvo. Sabrina não conseguia ver o rosto do homem, pois ele estava agora com as costas para o sol, e sombras escondiam seu rosto. Mas reconheceu a voz. Era o mesmo que a perseguira nos bosques pela manhã. — Minhas roupas? — Estão secando na sala de banho ao lado — indicou o estranho. Nua e deitada em uma cama, Sabrina só pôde concluir uma coisa. — Conseguiu o que queria — murmurou com ódio! — Agora me deixe ir! Soluços convulsivos a dominaram, e não conseguiu ocultar a humilhação. Não queria lhe dar a satisfação de vê-la chorando e mostrar que sua dignidade estava em frangalhos. Mas era impossível parar de soluçar. — Por favor, mulher! Jamais encostei um dedo em você! Carreguei-a para casa, a fim de não deixá-la à mercê daqueles brutos, porém isso foi tudo. Nada fiz de indecoroso. Mas Sabrina não o ouvia, o som de seus soluços abafando a voz, do homem, e o arfar de sua respiração entrecortada dominando o ambiente. Só conseguia pensar que sua inocência fora-lhe arruinada de maneira brutal. Como poderia voltar para casa, enxovalhada e desonrada? Como explicar o que acontecera para seu pai? Para seu futuro marido? Deus! Não conseguia se lembrar do estupro, porém devia ter sido terrível, pois todo o seu corpo doía. — Vilão! Devolva minhas roupas! Sabrina o viu passar os dedos pelos cabelos em um gesto irritado, o resmungando algo que não conseguiu entender. — Pare de chorar! Dou-lhe minha palavra de honra e de cavalheiro que não a desonrei de nenhuma forma, nem tenho a intenção de fazer isso no futuro. Trouxe-a até minha casa para que se recuperasse. Minha irmã retirou seu vestido molhado para que não se resfriasse. Quanto a seus outros pertences, estão aqui. Ergueu a sacola recheada e deixou-a cair no chão ao pé da cama. A onda de desespero que a invadira momentos antes pareceu se dissipar. As lágrimas ainda escorriam pelo rosto da cigana, mas os soluços foram diminuindo até desaparecer por completo, Apesar da tontura e da visão nublada, conseguiu semicerrar os olhos e perguntar: — Quem é o senhor? O homem suspirou, aparentando alívio. — Finalmente um pouco de serenidade! Sou Anthony Kennington, visconde de Hastings, aos seus serviços. — Onde estão os outros homens? — Não tenho nenhum vínculo com os bandidos que a atacaram. Só os fiz desistir de persegui-la. — Mas estava me espreitando no bosque. — Bem... Sim, fiquei surpreso ao ver uma moça se banhando no riacho. Não estou acostumado a esse tipo de visão, entendeu? Sabrina enxugou o rosto molhado com as costas da mão. Anthony se dirigiu à uma cômoda e retirou da gaveta um lenço branco. Voltou, e o estendeu para a cigana, que o recusou. O visconde deixou o tecido cair sobre as cobertas. — Onde estou? — perguntou Sabrina com hesitação. — Em meu quarto. A explicação tornou a deixá-la nervosa. Sentiu a absurda impressão que seria engolida pelas paredes do grande cômodo, e aprisionada ali para sempre. A não ser que tivesse sido convidada pela dona da casa para ler as cartas do taro ou a palma de sua mão, não conseguia imaginar um motivo para estar dentro de tal mansão. E se alguém a encontrasse ali, uma intrusa indesejável, seria atirada na prisão. Estava acorrentada, mesmo que de maneira invisível, e precisava fugir dali antes que outras pessoas, além de seu salvador, a encontrassem. Sues olhos brilharam de angústia. — Não posso ficar aqui — murmurou, se esquecendo que mal conseguia se mexer. — Preciso partir. — Com o ferimento que tem na cabeça? Impossível. Mas está a salvo, como já lhe disse. Como era insistente! O corte na testa não a deixara estúpida. Como podia confiar em um gajo? Um estranho que não era de sangue cigano? Quem sabe fora o próprio nobre quem a atingira com uma pedra na cabeça! Com cuidado, Sabrina tateou a testa e o alto da cabeça. Sob as bandagens, sentiu um calombo enorme, o responsável pela dor. — O que aconteceu comigo? — Deve ter sido atacada, tentou fugir, e bateu com a cabeça em uma pedra — resumiu Anthony. Sabrina não se lembrava de nada disso, só dos últimos momentos em que ficara consciente. Não tinha escolha a não ser aceitar a versão dos fatos que recebia... pelo menos por enquanto. Pouca coisa fazia sentido. — Por que estou aqui? — Estou cuidando de seu ferimento. — Não sabe quem sou, e um cavalheiro como o senhor não se preocupa com moças como eu. — E quem é você? Era melhor confessar de uma vez e acabar com essa situação, pensou Sabrina. Postergar o inevitável era tolice. Em um sussurro, respondeu. — Sou uma cigana. — Sim, já sabia disso, mas perguntei seu nome. Sabrina ignorou a pergunta. — Já sabia que eu era cigana? O visconde aquiesceu com um gesto de cabeça. — Sim, mas sobre seu comentário, gostaria de explicar que uni verdadeiro cavalheiro ajuda qualquer mulher em dificuldades. Sabrina piscou diversas vezes, confusa, e seus olhos o analisavam da cabeça aos pés. Anthony permaneceu firme, com as pernas afastadas e os braços atrás das costas, como se passasse por um exame militar. Usava uma camisa de linho branco, a gravata surgindo da abertura do colete cor de manteiga, e Sabrina notou os ombros largos e o tórax musculoso. As pernas longas estavam cobertas pela calça marrom e botas de cano alto. Deitada, Sabrina se sentiu em desvantagem, pois o visconde parecia uma torre inclinada em sua direção. A desconfiança em seu rosto devia ser evidente, pois Anthony se ajoelhou devagar junto à cama, ficando com o rosto no mesmo nível do colchão. Seu sorriso era amigável, pensou Sabrina, e diluía um pouco a sensação de força maciça. Jamais vira um gajo como aquele. A maioria dos estranhos não costumava fitá-la, a não ser com desdém, porém a expressão bondosa no rosto bonito e másculo parecia sincera. Ou talvez fosse o galo na cabeça que a fazia ver coisas que na verdade não existiam. Homens bondosos de sangue azul não perambulavam pelos bosques ajudando ciganas em dificuldade, por mais que Anthony dissesse que as coisas haviam acontecido assim. De qualquer modo o gesto de ajuda lhe trouxera um pouco de conforto. Encontrar alguém compassivo e bom, oferecendo amparo em vez de brutalidade, ajudava á aliviar seu pobre coração. Os olhos do visconde eram atentos e serenos. Não havia ódio por trás das pupilas verdes. Os cabelos dourados caíam em mechas sobre seu rosto. Era bonito... para um gajo, pensou. E tão alto e forte! Percebeu a necessidade que tinha de uma cama tão grande, e... lá estava ela, deitada nessa mesma cama! Não podia ficar naquele lugar! Sua vida já não corria perigo, portanto não havia motivo para se esconder. Se o que Anthony dissera era verdade, então seus assaltantes ignoravam onde se encontrava, o que significava que pelo momento podia voltar para sua caravana em segurança. Não deixara pistas, e os bandidos não iriam perseguir sua família. Sua única preocupação nos últimos dias fora que os rufiões descobrissem o acampamento cigano e matassem alguém para capturá-la. Embora sabendo que os demais ciganos tudo fariam para protegê-la, temia pôr a vida de algum deles em perigo. Por isso partira sem dizer a ninguém para onde ia. Sabia que sua ausência iria causar sofrimento à sua gente, mas era a única saída. Os homens que a perseguiam haviam sido incansáveis e estavam determinados a subjugá-la de qualquer maneira. Já haviam provado isso. Como cães perdigueiros, não haviam desistido da caça durante dias, e por certo ainda estariam cm seu encalço se não fosse pela interferência do visconde. E isso trouxe outra dúvida à mente de Sabrina. Por que, afinal, Anthony a salvara? Um homem do nível dele se preocupando com uma pobre cigana? Jamais na vida recebera ajuda de nenhum gajo, e não sabia que conclusão tirar de tão surpreendente atitude. Pelo que podia lembrar, seus perseguidores levavam armas, e Anthony devia ter percebido isso logo de início. Por que se arriscar tanto? Dissera que era o dever e a obrigação de todo cavalheiro proteger qualquer mulher em perigo, mas Sabrina não estava convencida, o que a deixava ainda mais confusa. — Preciso voltar para casa — tornou a dizer com voz fraca, pressionando os lençóis junto ao corpo, e tentando se soerguer. — Minha família deve estar preocupada com meu desaparecimento. Entretanto Anthony a fez repousar a cabeça nos travesseiros outra vez, com gesto delicado, mas firme. — Não está em condições de viajar. Debilitada demais para reagir, Sabrina não protestou, e tratou de se manter quieta para conter os espasmos de dor. Uma leve batida na porta do quarto chamou a atenção dos dois. Sabrina arregalou os olhos em pânico, mas Anthony tratou de acalmá-la. — Não se agite. É minha irmã, Ashley. Veio para tratar de você. Outra alma caridosa? Sabrina estava achando difícil acreditar em tanta bondade, em especial por parte de uma dupla de aristocratas, mas apesar do instinto que a fazia desejar fugir, estava fraca e dolorida demais para conseguir dar um passo. Anthony levantou-se para abrir a porta. A gaji entrou depressa, trazendo uma grande tigela de cerâmica repleta de frascos, que carregava com uma certa dificuldade. — Anthony, espero que entenda como foi difícil reunir tudo isso sem que ninguém me visse, em especial com a balbúrdia lá em baixo. — Agradeço muito, Ash. — O visconde tratou de trancar a porta e instruiu a irmã. — Coloque tudo sobre a mesa. A dama obedeceu e começou a arrumar os objetos com cuidado. Uma toalha, uma garrafa de bebida, pequenos potes, uma colher. Sabrina olhava para tudo isso, imaginando o que os dois estariam tramando. Quando Anthony comentou com a irmã que a paciente acordara, Ashley fitou a cigana com curiosidade. Sabrina notou como ambos se pareciam; os mesmos cabelos louros com nuanças acinzentadas, e idênticos olhos verdes. A dama não era tão alta como o irmão, embora também não fosse baixa, alcançando um pouco acima dos ombros de Anthony. Usava um vestido cor de pêssego com um corte logo abaixo dos seios, e os cabelos estavam recolhidos sob uma touca de renda branca; algumas mechas escapavam displicentes, emoldurando-Ihe o rosto. — Como se sente? — perguntou Ashley. Sabrina ficou calada. Essas não eram as palavras que esperara ouvir. Imaginara que a mulher lhe diria para se levantar e sair dali naquele instante. A fim de acabar com o silêncio constrangedor, Anthony respondeu por ela. — Vai se recuperar. Sem aguardar por uma resposta, ele dirigiu-se à sala de banho e voltou com um cântaro de porcelana cheio de água, que despejou na bacia sobre uma mesinha. Ashley pediu. — Coloque um dedo de uísque. Anthony obedeceu, e o líquido ambarino foi despejado na água. Ashley reuniu os objetos e colocou na mistura o conteúdo de outro frasco. O cheiro forte de vinagre atingiu as narinas de Sabrina. A mulher ainda não lhe pedira para sair da cama do irmão, e aos poucos o assustado coração de Sabrina voltou a bater com certa calma. Fechou os olhos, e permitiu que os irmãos preparassem a estranha infusão. Capítulo II Com um olhar furtivo, Ashley analisou a cigana em estado de torpor, e depois se voltou para o irmão, murmurando. — Não conseguiu evitar um escândalo dessa vez? Anthony arqueou as sobrancelhas. — Esperava que a deixasse nos bosques? — Bem, claro que não. Mas o baile será dentro de dois dias, a casa já está em alvoroço, e se nossos pais souberem que agora uma cigana dorme na cama de seu filho, cabeças irão rolar... a minha e a sua, sem dúvida. — Calma, Ash. Ninguém vai perder a cabeça. — Por que a trouxe para cá? — insistiu a gêmea em tom de leve reprovação. — Por que não a levou para o médico da cidade? — Tinha o dever, como cavalheiro, de tomar conta dessa moça e afastar os assaltantes. — Mas... Escondê-la no seu quarto?! — Onde mais a colocaria? Os quartos de hóspedes serão ocupados na noite do baile. Além disso, ninguém entrará em meu quarto sem permissão. Ela está a salvo aqui comigo. Ashley resmungou com ironia. — A salvo com você? — Claro! — Realmente, Anthony, quer que eu acredite que está agindo de modo desinteressado? Que não teve... outros motivos para trazer esta moça para sua cama? O visconde voltou a erguer as sobrancelhas. Por certo que as belas mulheres eram seu ponto fraco, mas sugerir que maquinara o salvamento da cigana apenas para seduzi-la quando ainda estava fraca e indefesa, abalou seus brios de homem. — Julga-me um cafajeste sem escrúpulos, Ash? — Não, mas um namorador — corrigiu Ashley com frieza. — Acha que ignoro todas as acusações que já sofreu por parte de pais irados, irmãos, maridos, e... — Não precisa continuar — interrompeu o visconde, que não queria ouvir o que já sabia de cor e salteado. — Já entendi. Minha reputação é deplorável. — Então compreende minha preocupação. Precisamos pensar na felicidade de Cecília, e tudo farei para que seu début seja um estrondoso sucesso. — E será. Acredita de fato que eu iria arruinar a noite de minha irmã anunciando que tenho uma cigana em minha cama? — Não sei o que se passa na sua cabeça, meu irmão — replicou Ashley com voz cansada, mas sincera. — Realmente, Ash! Pensei que seria mais compreensiva a respeito de minha boa ação, já que vive dizendo que preciso ser mais responsável. — Esconder uma mulher nua em sua cama não é o tipo de responsabilidade que tinha em mente, Anthony! Sim, o visconde sabia muito bem a qual tipo de responsabilidade a irmã se referia, e só de pirraça, imaginou-se acariciando o corpo despido da bela moça em sua cama. Essa sim seria uma missão que cumpriria com todo o prazer! A voz de Ashley interrompeu suas divagações eróticas. — Como pretende cuidar dela? — Com sua ajuda, é claro. — Sem dúvida — retrucou a gêmea com azedume. — Ora, Ash! Vamos lá! Não fique desesperada. A casa está imersa no caos, lembra-se? Ninguém irá suspeitar de nada, já que tudo está fora do lugar. Ashley pareceu reconhecer que havia um fundo de verdade nisso, mas logo replicou. — E quando estivermos todos lá em baixo, na sala de jantar, por exemplo, quem cuidará da moça? — É muito simples. Não deixarei meu quarto, e não chamarei atenção se faltar a algumas refeições, porque está tudo de cabeça para baixo nesta casa. — E na noite do baile? Anthony fez uma pausa e relanceou um olhar sobre o ombro para a cigana de olhos fechados na cama. — Talvez alguns dias de descanso curem o ferimento e a façam recuperar as forças. Talvez possa partir antes do baile. — E se isso não acontecer? — Descobrirei uma solução para o problema. — Tornou a fitar a irmã com determinação. — Mas a moça não irá embora antes que se recupere. Fez-se um breve momento de silêncio, enquanto Ashley arrumava os frascos sobre a mesa. — Anthony, se aqueles homens no bosque a chamaram de ladra, não entendo por que ignorou essa queixa com tanta facilidade. Como sabe que a moça é inocente? — E que evidências tenho de que seja culpada? — Não é razão suficiente para ocultar uma possível criminosa em casa. O visconde suspirou com força. — Duvido muito que seja ela uma criminosa, mana. Aqueles homens não pensavam em fazer justiça quando atacaram uma mulher indefesa e desarmada. — Talvez sim — murmurou Ashley, fitando além. — Para uma pobre cigana, ela usa um medalhão de ouro muito bonito. Anthony seguiu o olhar da irmã, pousando-o sobre o berloque em uma mesinha perto da cama. — Então talvez não seja uma cigana pobre. Recuso-me a assumir que ela roubou o medalhão apenas por que você acredita que tal jóia está acima das posses dessa moça. — Por quê? Acha que pobreza não combina com uma mulher, bonita? — Não, mas me recuso a acreditar que aqueles homens mal-encarados arriscariam suas vidas lutando comigo, apenas por causa de um berloque sem importância. Os olhos de Ashley se fixaram nos do irmão que pareciam se refletir como em um espelho. —- Espero que saiba o que está fazendo, Anthony. — Sempre sei — murmurou o visconde com um sorriso apaziguador, depositando a colher sobre a mesa. — O sal já derreteu. Espiando dentro da cumbuca para confirmar as palavras do irmão, lady Winthrop tomou um pedaço de linho na mãos e mergulhou-o na água com sal, torcendo em seguida para retirar o excesso. — Tenho outro favor para lhe pedir — sussurrou Anthony com voz acariciadora. A irmã ergueu as sobrancelhas em uma pergunta muda. — Poderia descer e providenciar uma refeição para nossa paciente? Ashley deixou cair os ombros com desânimo. — Acha que pode ficar sozinho com ela? — Bem, não creio que minha cigana corra perigo. — O que quero dizer é que não é apropriado que cuide de uma moça que não é sua esposa — retrucou a gêmea como se falasse com um débil mental. — Não vejo nada de impróprio em colocar uma compressa em sua testa. Pode buscar comida? A moça deve estar morta de fome após tantas horas. Os olhos de Ashley brilharam, fitando do irmão para a cigana, e fazendo um muxoxo de desagrado. — Está bem. — Deixou o pano cair na bacia e rumou para a porta do quarto. — Voltarei logo. — Olhou para Anthony com severidade. — Comporte-se. O visconde aquiesceu com um gesto irônico de cabeça. Sinceramente! Será que a irmã esperava que ele pulasse sobre a cigana assim que ficassem sozinhos? Levando a bacia até a cama, tratou de não fazer barulho para não perturbar a ninfa adormecida. Parecia tão serena, pensou, a respiração compassada, os olhos fechados, as madeixas negras espalhadas sobre os travesseiros. Colocou a bacia sobre a mesinha de cabeceira, e tratou de trancar a porta para evitar algum intruso. Voltando para o lado da cigana, analisou-a por muito tempo. Parecia tão vulnerável e pequena sob a grande quantidade de cobertas e lençóis, e na enorme cama com dossel. Não que fosse de estatura baixa; ao contrário, era mais alta que a maioria das damas elegantes que conhecia, porém havia algo de frágil que a circundava como um halo. E era linda! Os olhos de Anthony pousaram nos contornos do rosto dourado pelo sol. As faces eram coradas, o nariz pequeno e gracioso, os lábios cheios e sensuais... Controle-se, meu velho, disse uma voz no cérebro de Anthony. Lembre-se de seus deveres. A moça está sob sua proteção. Não vai ser um energúmeno e seduzir essa criatura vulnerável. O que se passara com ele por um breve instante?, recriminou-se. Não era um malandro tão grande assim, fosse lá o que sua irmã gêmea pensasse. O cavalheiro em seu íntimo era mais forte que o sem-vergonha, tinha certeza. Mas era uma tragédia ter uma ninfa nua e sedutora em sua cama, e nada poder fazer a não ser fantasiar. Logo pensamentos mais sérios e sinistros o possuíram, e imaginou quanto tempo ela estivera nos bosques fugindo de seus perseguidores. Por que aqueles homens desejavam lhe fazer mal? Apenas por maldade? Para violentá-la? Ou seria outra coisa? Esperava respostas pelo menos para algumas dessas perguntas em breve. No momento necessitava tomar conta de sua cigana, embora detestasse incomodá-la; iria retirar a compressa de sua testa e substituir por outra. Talvez, se ela tivesse voltado a dormir, não a despertaria. Uma mão pequena, mas firme segurou-lhe o pulso com firmeza. — O que está fazendo? — perguntou a cigana O que restava da letargia parecia ter desaparecido, e os profundos olhos, alertas e observadores se fixaram Anthony. — Preciso aplicar outra compressa — respondeu o visconde com calma. — Irá ajudar. Sabrina virou o rosto para a bacia. — O que há lá dentro? — Uísque, vinagre e sal misturados em água. É bom para dor de cabeça. A jovem pareceu analisar a bacia como se pudesse mergulhar dentro. — Deveria conter cidra de maçã misturada com vinagre e água. Nada de sal e uísque. — E por quê? A cigana não respondeu. Sua atenção parecia presa em outra coisa, enquanto vasculhava o quarto com olhar. — Sua irmã já foi? — Ashley desceu para preparar sua refeição. — Ela voltou a fitá-lo com olhos poderosos como um mar de tempestade. Por fim ela libertou o pulso de Anthony e voltou a se recostar nos travesseiros. — Posso colocar a compressa? — perguntou o visconde com polidez. Diante do silêncio de Sabrina, tratou de fazer o trabalho sem demora, os dedos tocando de leve as madeixas negras e brilhantes, que recendiam a pinho e outras fragrâncias dos bosques. Anthony mergulhou o pano na água e torceu de leve. — Isso deve lhe dar algum alívio. — Alisou o pano sobre a testa da jovem. — Jamais ouvi falar que se usa cidra para dor de cabeça — comentou para quebrar o gelo e tentar um diálogo. — Entende de remédios? Como o silêncio continuasse sob o olhar persistente da moça, o visconde implorou. — Pelo menos me permita o prazer de saber seu nome. A cigana semicerrou os olhos, e Anthony voltou a colocar um joelho sobre o assoalho, ficando com a cabeça no mesmo nível dos travesseiros. — Posso compreender sua aflição por estar em um ambiente estranho e com um ferimento, mas Ashley e eu só queremos o seu bem. Viu-a piscar diversas vezes, como se ponderasse sobre o que ouvira, e então ela murmurou: — Ouvi sua conversa sussurrada. — Estávamos discutindo sua recuperação. — Ela não me deseja aqui. Para alguém que deveria estar dormindo quando conversara com sua irmã, a cigana parecia muito alerta; porém, ela chegara a uma conclusão errada. Ashley tinha um coração de ouro e nunca escorraçaria uma pessoa enferma. Anthony tratou de defender a gêmea. — Ashley estava apenas um pouco apreensiva... — Pelo fato de eu ser quem sou. — Não é verdade. Mas a expressão séria da moça o fez desistir. — Então por que está me escondendo em seu quarto? Não estou convencida. — Pára protegê-la de seus agressores. Em resposta, o visconde recebeu um sorriso irônico e triste. — E de sua família também? Anthony hesitou sem saber como responder a uma pergunta tão direta como aquela. Inclinou a cabeça para um lado e, de maneira relutante, concordou. Por que negar o óbvio? Mas a fim de afastar os pensamentos da moça sobre sua família, perguntou: — O que aconteceu nos bosques hoje? Por que aqueles homens a perseguiam? — Não sei — replicou a ninfa com voz distante. — Quer me dizer que a escolheram ao acaso para ser sua vítima? — Não. — Então o que foi? Sabrina se encerrou no mutismo outra vez. O que ela estaria escondendo? Jamais passara pela cabeça do visconde que ela fosse uma criminosa, como dissera um de seus agressores, porém mesmo que a tivesse superestimado e descobrisse que fizera algo errado, não iria entregá-la às autoridades. Tratou de expressar seus pensamentos. — Ainda que seja uma criminosa, continuarei a protegê-la porque prometi, e... — Não sou uma criminosa! — Acredito em você — replicou Anthony com sinceridade. — Então me conte o que de fato aconteceu. Com um suspiro profundo, Sabrina ficou muito séria, e uma nuvem escura pareceu envolver os lindos olhos azuis. — Há alguns dias, estava na feira de cavalos do condado. Meu pai fazia negócio com os fazendeiros e cavalheiros locais, e eu lia a sorte para as mulheres e crianças. Então esses gajos passaram pela minha carreta algumas vezes durante o dia... — Perdão, mas quem passou por lá? — Gajo. Um homem que não tem sangue cigano. — Compreendo. Por favor, continue. — Na ocasião não dei muita importância — resumiu Sabrina. — Por fim um deles pediu uma consulta nas cartas do taro, mas ficou o tempo todo me encarando. Quando a leitura terminou, só pensava em me livrar dele, porém o homem me agarrou pelo braço e disse que eu não tinha onde me esconder. Resmungou que eu era preciosa demais para que me deixasse escapar de novo, como seja me conhecesse. Percebi que estava em uma enrascada, então dei-lhe um chute no... Anthony tossiu, lembrando-se do chute que também levara. A menina era de fato corajosa, já sabia disso. — Consegui fugir — continuou Sabrina — mas desde então os dois homens me perseguem. — E já faz quanto tempo? — Dois dias. Parei de correr para me refrescar no riacho, pensando que conseguira despistá-los, mas estava errada. O resto o senhor já sabe. Os olhos atentos de Anthony se tornaram pensativos. Sem dúvida o medalhão era roubado! Mas, de qualquer modo, os dois imbecis desejavam vingar seu amor próprio ferido porque a cigana escapara, e fazer "justiça", violentando a garota. Só em pensar nisso, sua expressão se tornou sombria. — Verei que chegue ao seu acampamento sã e salva, assim que estiver pronta para partir. Dois olhos enormes o fitaram curiosos. — Por quê? — Porque está sob a minha proteção. Assim dizendo, Anthony se ergueu e foi até a escrivaninha para pegar os fósforos. O sol já desaparecera, deixando o céu com as cores do início de noite. O fogo na lareira não iluminava o quarto muito bem, então ele acendeu um castiçal, envolvendo o ambiente com uma luz pálida. O medalhão brilhou à luz da vela, como acontecera junto ao riacho naquela manhã. Retirara o adorno do pescoço da cigana assim que a trouxera para o quarto, não desejando que a corrente a atrapalhasse. Estendeu a mão e pegou o berloque. Era simples, oval, e um pouco maior que o tradicional, mas no geral tinha uma aparência bastante comum. Ostentava apenas um desenho esculpido da cabeça de um leão. Recolocou o objeto sobre a mesinha, e fitou a cigana, que o observava com atenção. — Agora que me relatou seu problema, pode me conceder a honra de dizer seu nome? Por um instante a viu indecisa, como se julgasse já ter falado demais e esse último detalhe fosse absurdo. Mas resolveu falar: — Meu nome é Sabrina Kallos. Sabrina percebeu o sorriso do visconde à luz da vela. Não entendia por que esse sorriso a deixava tão inquieta e ao mesmo tempo tão tranqüila. Considerando quem Anthony era e aonde a trouxera, deveria ficar mais alerta e desconfiada, e nunca se distrair. Mas nesse momento, com a terrível dor de cabeça e a sonolência, o sorriso amigo e caloroso era tudo que precisava para se acalmar. Anthony rumou para o outro lado do quarto com passos lentos e sem fazer ruído e, erguendo uma poltrona, colocou-a ao lado da cama, sentando-se. — Tem um nome muito interessante para uma cigana. — Recebi o nome do rio Sabrina. — No País de Gales? — Sim, onde nasci. Anthony aquiesceu. — E eu recebi o nome de meu avô. — Sua família é grande? — Cresce sem parar — admitiu o visconde com outro sorriso encantador. — Ashley e eu somos gêmeos; ela se casou faz alguns anos e tem dois filhos. Temos também uma irmã mais nova, Cecília, que está prestes a ingressar no mercado matrimonial. — Inclinou a cabeça para um lado. — Foi isso que Ashley quis dizer quando falou que a casa está em alvoroço. Todo mundo está envolvido na preparação do baile quando Cecília será apresentada à sociedade. — E quando será? — Depois de amanhã. A dor de cabeça de Sabrina aumentou. Seu cérebro rapidamente calculou todas as catástrofes que a aguardavam no dia do evento, caso ainda estivesse presa no quarto do visconde. O que mais a apavorava era pensar que alguns dos convidados a descobrissem ali. E haveria centenas deles, por certo. Não era tola, pois com freqüência ouvira a história de sua prima Gulseren e o modo terrível como fora tratada pela nobreza. Fora na primavera anterior quando a prima viajara pelo campo, oferecendo-se para ler a sorte das damas ricas e prestigiadas. Gulseren tivera a má sorte de ir parar em uma imponente mansão na manhã de uma festa similar, e logo fora escorraçada do local pela dona da casa, que ordenara aos criados que expulsassem "a cigana nojenta" de suas terras. Sabrina estremeceu só em pensar que poderia receber o mesmo tipo de tratamento. — Preciso ir embora antes do início do baile — murmurou com voz aflita. Mas recebeu uma resposta autoritária. — Nada disso! Tenha calma e paciência. Já disse que aqui está a salvo. Os criados não a incomodarão no dia do baile com tantos convidados para atender. Além disso a porta ficará trancada. Pelo modo como falou, alguém poderia pensar que era verdade e que ela ficaria tranqüila, mas Sabrina conhecia muito bem o modo como os ciganos eram tratados para acreditar nessa afirmação com ingenuidade. Como se lesse seus pensamentos, Anthony enfatizou. — Nada de mal irá lhe acontecer. Acredite em mim. Acreditar na palavra de um nobre? Nem mesmo conhecia direito o visconde Hastings! Não tinham o mesmo sangue, e na verdade ele não tinha nenhuma obrigação a seu respeito. Tinha certeza que nunca a apoiaria contra uma multidão de nobres enfurecidos... seus iguais. Podia colocar compressas em sua testa, alimentá-la e levá-la para casa, mas, além disso nada faria para apoiá-la, ficando contra as pessoas de seu próprio meio. Uma mão quente e forte cobriu a sua, fazendo pressão, e Sabrina sentiu que estremecia. — Acredite em mim — repetiu Anthony com veemência. Seus olhos estavam mais semicerrados, e à luz da vela, pareciam dois lagos profundos. A reação de Sabrina ao gesto tão simples foi um choque, e não entendeu por que seu corpo reagia de tal modo, fazendo-a estremecer e sentir uma espécie de descarga elétrica. Devia ser fome, raciocinou com objetividade. Uma nova batida na porta chamou sua atenção, e logo o visconde virou a cabeça para a porta com um gesto rápido. Dirigiu-se à porta, destrancou-a, e deixou Ashley entrar. — São quase sete horas — disse a irmã, entregando uma bandeja para o visconde. — Pretende jantar com a família? — Creio que não. Ashley cerrou os punhos, irritada. — E se mamãe achar que está doente e vier procurá-lo? Sabrina enrijeceu o corpo ante tal possibilidade. — Apenas garanta à mamãe que estou muito bem. Diga-lhe que... Estou envolvido em um assunto urgente. É isso! Jantarei muito mais tarde, de preferência quando todos já tiverem ido dormir. Sabrina relaxou os músculos tensos. — Muito bem — suspirou Ashley. — Darei suas desculpas. Mas, por favor, não perambule pelos corredores à noite. Trarei uma ceia para você mais tarde. — Deu as costas, resmungando. — O que Daniel irá pensar se me vir trazendo outra bandeja para cá? — Apenas não deixe seu marido ver — foi a resposta sábia do irmão. Com mais um suspiro aflito, Ashley deixou o quarto, enquanto Anthony Voltava a trancar a porta, equilibrando a bandeja na outra mão. Sentindo o aroma delicioso de sopa quente, Sabrina percebeu como estava faminta. Anthony tornou a se sentar com a bandeja sobre os joelhos. — Está com fome? — Um pouco — mentiu a cigana, enquanto seu estômago roncava, aflito. Então o visconde mergulhou a colher na tigela e a ergueu sem derramar uma só gota de sopa nas bordas de porcelana. Sabrina arqueou as sobrancelhas. — O que está fazendo? — Vou alimentá-la. Não sou cego e já percebi suas caretas de dor sempre que tenta se sentar. É melhor que fique como está. Sabrina protestou que não queria que lhe dessem comida na boca porque não era um bebê indefeso, mas com a colher já perto, e o forte aroma de temperos, apenas obedeceu com um muxoxo de desagrado e orgulho ferido. Fechando os olhos, saboreou a sopa cremosa. Era ainda melhor do que imaginara. Anthony continuou a colocar as colheradas em sua boca, de vez em quando limpando seu queixo com um guardanapo, quando alguma gota tentava escorrer. Quando a


LoveAndFaith (Chapter 2) - Wed 27 Apr 2016

Interesting story, keep it coming.


Kimmy (Chapter 1) - Sun 17 Apr 2016

Just read the first chapter and can't wait for you to update already it is going to be a awesome story


INUYASHA © Rumiko Takahashi/Shogakukan • Yomiuri TV • Sunrise 2000
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